Foto: TV Brasil/Divulgação |
A edição inédita do programa Trilha de Letras recebe a tradutora e pesquisadora americana Flora Thomson-DeVeaux nesta quarta (16), às 23h30 na TV Brasil. Responsável por uma nova tradução para o inglês do livro "Memórias póstumas de Brás Cubas", clássico de Machado de Assis, ela conversa com a apresentadora Eliana Alves Cruz sobre a obra que viralizou na internet após uma booktuber ler e comentar a respeito.
Gravado na BiblioMaison, o Trilha de Letras pode ser acompanhado em formato podcast nas plataformas digitais. O conteúdo também fica disponível no app TV Brasil Play e no canal do YouTube da emissora pública. O programa ainda tem transmissão na Rádio MEC no mesmo dia, mais cedo, às 23h.
No "Dando a Letra", quadro com dicas de leituras, a booktuber Daniela Erthal indica o livro "A Segunda Pátria", romance do escritor Miguel Sanches Neto. Na envolvente narrativa, o autor propõe um conteúdo verossímil em muitos aspectos ao trazer uma perspectiva ficcional que subverte a realidade da história brasileira. Provocativo, o texto inclui metáforas sobre racismo, além de abordar democracia e liberdade ao conjecturar o nazismo no país.
Desafio de traduzir "Memórias póstumas de Brás Cubas"
Durante a entrevista exclusiva para o Trilha de Letras, Flora Thomson-DeVeaux aborda a natureza do trabalho de tradução, sob a perspectiva dos códigos e forma de falar, a partir da linha do tempo e das características de cada idioma. "O desafio é preservar. Não introduzir elementos demais na obra", alerta.
Radicada no Brasil, Flora lançou uma versão de "Memórias póstumas de Brás Cubas" que provocou a redescoberta de Machado de Assis, primeiro presidente da Academia Brasileira de Letras (ABL), entre a população dos Estados Unidos.
A tradutora explica como conduziu esse processo para respeitar a escrita original do Bruxo do Cosme Velho. "Comprei muitos dicionários do português para o inglês do século 19. Bato o olho numa palavra do Machado. Penso numa série de possibilidades de tradução, mas, às vezes, as nuances das palavras que me ocorrem já são tingidas por uma vivência do século 21. Tento fazer esse exercício de imaginação como se Machado tivesse acabado de me entregar os manuscritos", pondera.
Flora fala sobre essa lógica de apresentar um texto que desperte o interesse do público, mas associado à ideia original do célebre escritor. "Penso que preciso construir essa ponte. Ao mesmo tempo que busco fazer a tradução mais aproximada daquele momento do Machado, estou chegando com mais de um século de atraso no leitor. É um esforço de habitar a obra nos termos dela e perceber quais os acenos preciso fazer para que o leitor não perca a referência do que Machado está dizendo", afirma.
O livro do autor brasileiro chegou a ficar entre os dez mais comprados na seção de América Latina da Amazon. A marca obtida pelo clássico "Memórias póstumas de Brás Cubas" é considerada um feito enorme já que apenas 3% da literatura consumida pelo público norte-americano é de romances traduzidos, escritos originalmente em outros idiomas que não o inglês.
Humor e crítica social nas camadas do texto original
Flora ainda menciona que essa é a quarta tradução do título para o inglês. "É raro ter tantas traduções para uma mesma obra. É uma janela inacreditável para começar a expor as riquezas latentes no texto que começam a ser reveladas", compartilha ao comentar sua relação com as versões anteriores e a respeito do que não é dito verbalmente pelo personagem principal, mas está nas entrelinhas do texto.
"Não existe uma resposta certa. Não é uma equação matemática. É uma questão muito subjetiva. São sistemas de escolhas conscientes e inconscientes", declara Flora para refletir sobre as diversas traduções do mesmo livro. "Machado tem um jeito muito seco. Brás Cubas não vai se esforçar minimamente para você entender a piada dele", sugere a tradutora que se engajou e ficou surpresa com o conteúdo da narrativa. "Comecei pela galhofa e saí pela melancolia", resume.
A convidada destrincha o sentimento que Brás Cubas não explicita, mas Machado de Assis demonstra sobre a sociedade escravagista da época. "O que está na primeira camada é o humor, mas a análise da crítica social e do panorama da sociedade brasileira é mais fácil para o leitor perder. Não percebi tanto numa primeira leitura. Então, a minha preocupação era fazer com que isso transparecesse", pontua.
Interesse pela língua portuguesa e pela tradução
Flora revela no Trilha de Letras como nasceu sua paixão por Machado de Assis e pelo Brasil. "Há quinze comecei a estudar português. Foi por acaso. O Brasil não fazia parte da minha vida. Estudei espanhol na escola, como muitas crianças nos Estados Unidos, mas não tinha conexão com a América Latina e muito menos com a língua portuguesa. Na faculdade, eu comecei a estudar. Era muito difícil", recorda.
A tradutora explica a dinâmica de sua atuação profissional e conta que se diverte com o instigante trabalho. "Você pega os textos e remonta o quebra-cabeça em outra língua. Abre as entranhas da obra e a refaz na sua língua materna. É incrível", relata.
A entrevistada ainda fala sobre a Rádio Novelo, onde é diretora de pesquisa, e seu novo projeto de lançar os roteiros de alguns dos episódios em formato de plaquete, um livro curto, feito de forma artesanal e barateando os custos ao leitor.
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