Reprodução |
O submundo do Jogo do Bicho, prática proibida por lei cuja operação ocorre nos moldes de uma máfia, é o tema da série 'Vale o Escrito – A Guerra do Jogo do Bicho', Original Globoplay já disponível. Com sete episódios, sendo o primeiro liberado para não assinantes da plataforma, a produção traz os próprios os protagonistas - bicheiros, seus herdeiros e suas mulheres - explicando a história de suas atuações e a dinâmica do negócio, sem poupar críticas e acusações mútuas. Assassinatos que abalaram o Rio de Janeiro são revisitados e novos detalhes e informações estabelecem conexões que não podiam ser feitas quando estes crimes ocorreram.
A docussérie resgata a trajetória do Jogo do Bicho com a sua estruturação a partir da criação de um grupo, em meados dos anos 1970, chamado de “Cúpula da Contravenção”. E traz análises de historiadores e jornalistas sobre como estes banqueiros se tornaram patronos de escolas de samba, em comunidades onde mantêm seus negócios a partir da influência do Jogo do Bicho, além de destacar a conversão como parte fundamental da rede de corrupções que circunda o Rio de Janeiro.
Com supervisão artística de Pedro Bial, ‘Vale o Escrito’ é produzido pelo Conversa.doc, núcleo de documentários do ‘Conversa com Bial’. A direção artística é de Monica Almeida, e os diretores são Fellipe Awi, Ricardo Calil e Gian Carlo Bellotti. A produção executiva é de Erick Brêtas e Mariano Boni.
Confira as entrevistas com o criador da série Fellipe Awi e o com o diretor e roteirista Ricardo Calil.
Entrevista com Fellipe Awi, diretor e roteirista
O que você destacaria na série como o maior diferencial?
Conseguimos que a história fosse, pela primeira vez, contada pelos protagonistas deste universo riquíssimo. Claro, ouvimos também jornalistas, historiadores e gente do Carnaval, mas o centro da história gira em torno dos membros da família Garcia, uma das mais tradicionais do bicho e do samba. Sabrina, Shanna e Tamara Garcia deram longos depoimentos, assim como Bernardo Bello. Essa família vive há quase duas décadas um conflito interno que está matando todos os candidatos a assumir o comando do jogo. Pela primeira vez, eles mesmos contam como a ganância e a disputa pelo poder foram capazes de exterminar tanta gente ao redor deles. Ouvimos também bicheiros históricos, como Capitão Guimarães e Piruinha, que formaram a famosa cúpula da contravenção, e falaram sobre a guerra vivida hoje pelo bicho. Além dos Garcia, a família Andrade (cujo líder original era Castor de Andrade) também vive uma guerra sangrenta entre seus membros.
Um dos episódios da série é dedicado a Adriano de Nóbrega. Como ele entra nessa guerra do bicho?
A história do Adriano foi uma espécie de cereja de um bolo que já estava bem recheado com a trajetória dos Garcia. Porque foi no seio desta família que nasceu a lenda do matador de aluguel mais famoso do Brasil. Antes de ter seu nome atrelado a casos recentes como o esquema de “rachadinhas” na Assembleia Legislativa do Rio, Adriano começou a matar a serviço dos Garcia, tanto inimigos externos quanto internos. Mudou de lado várias vezes na disputa familiar e foi assassinado quando já era sócio de um dos chefões da contravenção. Pouca gente sabe, mas ele sempre se considerou bicheiro, e não miliciano ou matador de aluguel.
Entrevista com Ricardo Calil, diretor e roteirista
Além das entrevistas, quais outras fontes foram pesquisadas para a construção dos episódios?
Nós tivemos um excelente grupo de consultores que estão entre os melhores jornalistas do Rio: Sérgio Ramalho, Chico Otávio e Aydano André Motta. Além disso, contamos com o trabalho de um dos mais promissores repórteres investigativos do jornalismo brasileiro, Iuri Barcelos. Eles nos forneceram contexto histórico, curiosidades de bastidores, contatos, pistas e documentos essenciais. Além disso, tivemos um excepcional trabalho de pesquisa de imagem a cargo de Marcio Selem e sua equipe de pesquisadores, que encontraram arquivos raríssimos sobre a história do jogo. Gostaria de destacar o excepcional trabalho de edição que ficou a cargo de Diego Ribeiro, que soube unir como ninguém as muitas pontas dessa história.
Ao chegar mais fundo na história, houve algo que te impressionou? Se sim, por quê?
A história que mais me impressionou foi a da família Garcia, que me pareceu uma mistura de novela, filme de máfia e tragédia grega. Se pegarmos a Shanna Garcia como referência, ela é uma mulher que teve pai, marido, irmão e tio assassinados, escapou de um atentado a bala, bateu de frente com a irmã gêmea e também com seu ex-cunhado, Bernardo Bello, hoje apontado como um dos maiores bicheiros do Rio.