Crédito: Alinne Tuffengdjian |
No dia 19 de abril, a TV Globo exibe 'Falas da Terra', um especial que traz o depoimento em primeira pessoa de 21 indígenas sobre suas histórias de resistência e de luta. O público conhecerá mais sobre os povos originários, para assim ter uma dimensão da pluralidade e da diversidade cultural que os mais de 300 povos indígenas brasileiros representam. Serão compartilhadas informações sobre preservação da cultura, língua e costumes dos diversos povos; proteção do meio ambiente e da vida; respeito à diversidade; histórias de resistência e ativismo; demarcação de terras; invasão de territórios demarcados; preservação das florestas; importância da literatura para ajudar na conscientização; entre muitos outros temas. Entre os convidados, estão indígenas que expressam sua luta e ganham seu sustento com a arte, seja através da música, da dramaturgia ou das artes plásticas.
Djuena Tikuna, cantora do Estado do Amazonas, foi a primeira indígena a protagonizar um espetáculo musical no Teatro Amazonas. Sua luta é pela preservação da cultura e da língua indígena através da música. Jornalista de formação, é ainda a primeira indígena formada em seu Estado. Sobre sua relação com a música, Djuena lembra da história de seu povo e faz uma relação direta de sua cultura com a arte. “Meu povo, Tikuna, é muito musical. Desde criança a gente gosta de cantar, minha mãe é cantora, já cresci ouvindo a cantoria dos meus ancestrais. Quando me mudei para Manaus, fui transformando a minha música na minha ferramenta de luta e de resistência”, diz a cantora. O povo Tikuna é o mais numeroso da Amazônia, fala uma única língua, que é a Tikuna. “A música indígena atravessa os mundos para transmitir a voz de um povo originário. A brisa, os ventos, o canto dos pássaros e o universo que nos rodeiam, as coisas que vemos e que só sentimos, isso tem sido ensinado para cada nova geração. A música é o que me dá força na minha luta. Tenho uma carreira de 15 anos divulgando a cultura, levantando comigo outros artistas indígenas que por muito tempo foram apagados”, explica.
Ela lembra ainda que a música teve um papel importante para superar a hostilidade que recebeu por ser indígena. “A música me fortaleceu porque eu sofri muito na universidade onde estudei, nos lugares por onde passei. Sempre vi os olhares do preconceito, mas nunca desisti da música porque ela que me traz força, é uma ferramenta de luta. Meu canto é minha luta. É uma mensagem de que meu povo resiste, meu povo já sofreu, já viveu massacres. Eu acredito que através da música eu consigo espalhar a mensagem de que nós estamos aqui e vamos continuar resistindo diante de tudo que acontece. Não somos um fantasma do passado, mas sim, estamos presentes, exigindo a garantia dos nossos direitos. Entre eles, o direito à vida. Eu tenho que espalhar isso como semente”, finaliza.
Outro indígena que está no especial e que usa a música como forma de resistência é Kunumi MC. Werá Jequaka Mirim ficou conhecido internacionalmente como Kunumi MC quando participou da cerimônia de abertura da Copa do Mundo no Brasil, em 2014. Sua principal luta é pela divulgação da cultura indígena e sua maior demonstração de resistência é pelo rap. Ele protesta em suas letras contra o desmatamento e a destruição do meio ambiente.
“A música para mim representa cura e também vida. Ela é como um irmão que está sempre ali disposto, só basta a gente receber com muito amor essa força que ela traz. Eu ouço o que ela tem a dizer e recebo tudo com muito amor. Para mim, a música cura nossa vida, espiritualmente falando. Tento usá-la para conscientizar as pessoas e espero que minha música chegue a muitos lugares do mundo, para que todos possam conhecer como é a vida, a realidade de uma aldeia, para que conheçam nossa força. O sentimento que compartilho com minha música é de respeito. Não tem como esconder a realidade do sofrimento do indígena, e a música também ajuda a mostrar isso”, diz o rapper.
Atriz, Lian Gaia também luta através da arte por mais espaços no teatro e no audiovisual para indígenas. “Ser atriz, para mim, parte desse lugar de ser indígena. Ser atriz indígena, nesse contexto urbano, no qual a etnia da minha família foi apagada, é um movimento de resistência e de reexistir. A gente resiste e reexiste. Ser atriz e me afirmar indígena, afirmar a história da minha família e minha história, tudo isso faz parte de um movimento de resistência. Ser atriz indígena no Brasil, curiosamente e cruelmente, é muito difícil e desafiador. O sentimento é de que a gente não pode se afirmar no nosso próprio país”, comenta a atriz.
Para Lian, a arte, assim como qualquer outro meio genuíno no qual os indígenas possam se expressar e ter voz, é um grande canal de expressão de luta. “A arte é fundamental para essa luta porque é um canal de visibilidade, de oportunidade para se denunciar o que vem acontecendo com meu povo. Ela tem vários braços, o canto, a interpretação, pode ser cantada, dançada, desenhada. São vários gritos, várias denúncias. Eu confio muito que minha arte tem um lugar de denúncia, de uma justa ira, na qual a gente se vinga dessa forma, denunciando através da performance, da poesia, do canto, da dança. Acredito também que a arte vem para deixar esse registro que a gente não tem, que nos foi negado, que foi apagado. É mais um documento. Para o nosso futuro, para minha sobrinha, meu filho, para que eles tenham o registro que eu não tive, para que meus futuros filhos possam ter”, complementa.
Emerson Uýra, bióloga e artista, tem reconhecida atuação na luta pela preservação ambiental através da arte e pelo respeito à diversidade. Uýra se apresenta como uma “árvore que anda”, em referência ao seu conhecimento científico da biologia e das propriedades medicinais das plantas, e compartilha seu conhecimento em aulas de artes e biologia, performances artísticas, maquiagens, textos e instalações. Para Emerson, há mensagens importantes que podem ser passadas através da arte.
“Busco contar os nexos entre violências social e ambiental, mas também entre diversidade humana e diversidade biológica. Busco tensionar e propor o repensar sobre o que chamamos de natureza – hoje tão estranha e violenta, repleta de um cotidiano de pressa e abandonos. Natureza para nós indígenas sempre foi nós mesmos – netos e netas da Vovó Floresta. Também gosto de recontar em meu próprio corpo, a história, a estética dos bichos, as plantas e os processos da natureza. São para lembrar e fazer encantar os mundos – do quanto podemos também aprender com os outros seres vivos, que já habitam este mundo muito antes de nós”, finaliza.
‘Falas da Terra’ tem direção artística de Antonia Prado, roteiro assinado por Malu Vergueiro, consultoria de Ailton Krenak e coautoria de Ziel Karapató, Graciela Guarani, Olinda Tupinambá e Alberto Alvarez. Rafael Dragaud assina a supervisão artística e Mariano Boni a direção de gênero. O especial vai ao ar no dia 19 de abril, logo após ‘BBB21’.
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