A Anatel autorizou no dia 9 de setembro, que canais de televisão fechados possam ser assinados e acessados pela internet ainda que o consumidor não tenha uma assinatura de TV por Assinatura. Com isso, libera a Fox+ e outros canais da Disney que vendiam o serviço, mas que tiveram de suspender por força de medida cautelar.
A questão teve início com a denúncia apresentada pela Claro, na qual alegava que a Fox Latin America e a Topsports Ventures estariam veiculando seus canais de TV paga por meio de sistema de assinatura independente na internet, configurando assim a prestação não outorgada de SeAC.
A Agência realizou, em 2019, Tomada de Subsídios para garantir ampla manifestação dos interessados. Paralelamente, foi expedida medida cautelar determinando que a Fox não comercializasse sua programação de forma desassociada do SeAC até que a Anatel decidisse em definitivo sobre o caso.
Ambas companhias entraram em uma disputa judicial e a FOX levou a melhor, mas o tema seguiu pendente na Anatel.
Para o relator do voto em pedido de vistas, Emmanoel Campelo, ''na medida em que se verifica a necessidade da contratação de serviço de telecomunicação para se usufruir do acesso aos canais pela internet, resta excluída a caracterização do SeAC, ele próprio serviço de telecomunicação. Não é razoável supor que, para ter acesso ao SeAC, o usuário tenha que contratar também o SCM [Serviço de Comunicação Multimídia, a banda larga fixa] ou o SMP [Serviço Móvel Pessoal, telefonia e banda larga móveis], como obrigatoriamente deve ocorrer para os usuários que desejarem acessar o conteúdo audiovisual veiculado pela internet''.
Para Campelo, um dos argumentos que exclui a oferta de conteúdo audiovisual da internet na Lei do SeAC é a necessidade da contratação de banda larga ou telefonia móvel para acesso.
A linearidade também não é importante para definir a questão. O monitoramento do mercado audiovisual é trabalho da Ancine (Agência Nacional do Cinema).
Para o fundador da Guigo TV, Renato Svirsky, o grande vencedor dessa batalha é o usuário, que já adotou o streaming e quer mobilidade também de canais. Ele disse que o SeAC apenas beneficiava os oligopólios e a pirataria, que cresce a números assustadores.
Segundo Svirsky, a lei do SeAC já deixa claro que canais por aplicativo é Serviço de Valor Agregado (SVA), mas acha que foi preciso a Globo agir para que a decisão saísse. Isto porque, a Globoplay anunciou a venda direta de canais pela internet no final do mês passado.
Svirsky entende que a Lei do SeAC tem coisas boas, como as cotas para produção nacional, mas elas acabam em 2022. Mas não coloca o consumidor como centro da norma. “As exigências acabam elevando o preço do serviço”, afirma.
Com a decisão, a Guigo TV projeta crescimento rápido do serviço, especialmente por meio de parcerias com os ISPs. “Os provedores conhecem os clientes na ponta e sabem qual a solução indicada”, disse Svirsky. Pelo acordo, os clientes dos provedores têm descontos na plataforma.
Para outubro, a Guigo TV prevê o lançamento de conteúdo on demand de 40 canais, como CNN Brasil, Disney Junior, ESPN Extra, ESPN Brasil, ESPN, Ei Plus, Disney Channel, Disney XD, Tv Rá Tim Bum, Cartoon Network, TLN Network, AMC, Film&Arts, Trace Brazuca, Trace Urban, Trace Latina, SIC Internacional e Eurochannel. No futuro, a empresa quer conquistar assinantes de outros países da América Latina.
WATCH BRASIL
O sócio fundador da Watch Brasil, Maurício Almeida, comemorou a decisão da Anatel, liberando a oferta de canais lineares pela internet. Segundo ele, sua empresa já tem um produto pronto para botar na rua e espera adesão maciça dos ISPs.
Para Almeida, a aplicação da lei do SeAC na internet funcionaria como uma camisa de força, “não se conquista audiência por lei”, ressalta. Ele afirmou que as exigências da norma, especialmente com o must cary (distribuição obrigatória de canais), tornava o preço de entrada do serviço muito alto, o que justifica a fuga de assinantes.
Almeida disse que do jeito que o mercado estava, só beneficiava a pirataria. Com a decisão, os usuários devem migrar para os serviços pela internet, porque, no seu entendimento, vão preferir ir para uma situação regular, sem riscos, como se dá com o roubo de sinal.
O sócio da Watch TV espera uma agitada no mercado de streaming, mas ressalta que o churn é muito alto, em torno de 25%, e as empresas precisam ficar atentas a isso. Ele disse que a propensão é o cliente ficar trocando de serviço a depender do conteúdo. No caso da sua empresa, a situação é melhor já que funciona como um market place.
A Watch Brasil também depende do apoio dos ISPs para crescer. Almeida informa que seu aplicativo é compatível com 15 dispositivos diferentes, o que facilita a agregação de clientes. Sua carteira já conta com 200 mil assinantes.
TV Linear por Assinatura na Internet (TVLAI)
O relator, Vicente Aquino, disse que o SeAC é um dos serviços com menor competitividade, temendo a concentração já que a categoria perdeu milhões de assinantes nos últimos anos. Aquino também fez uma comparação com os Estados Unidos, onde surgiram serviços como SlingTV, DirecTV Now e YouTube TV que aumentaram a base de espectadores no país.
Aquino apontou as consequências de considerar streaming como TV paga tradicional: os serviços iriam sofrer com maior carga tributária, aumento de preços ao consumidor e sufocamento de startups. Por outro lado, o enquadramento de TVLAI como serviço de valor agregado (SVA) estimularia a concorrência com a entrada de novos competidores, aumentaria a população com acesso ao conteúdo audiovisual e, por fim, traria expansão do serviço de banda larga fixa.
Por outra vez, Campelo discorda da adoção do termo “TV Linear por Assinatura na Internet”, que pode confundir consumidores sobre o serviço prestado pela lei do SeAC. Aquino defendeu que as prestadoras de TVLAI não tem gerência sobre a rede, e, portanto, são considerados Serviço de Valor Adicionado.
As áreas técnica e jurídica da Anatel já haviam defendido que o streaming não é considerado serviço de acesso condicionado, não cabendo regulação da agência. Uma possível revisão teria de ser feita na lei, algo que foge à competência da Anatel e cabe ao Congresso Nacional.
Operadoras se preparam para vender TV via streaming
Com a nova definição, as operadoras recebem segurança jurídica para oferecer canais lineares via streaming. Uma das principais motivações para adotar modelo de negócios é a diferença tributária: o serviço pelo SeAC é onerado com ICMS, Fust, Funttel e Condecine, enquanto serviços online pagam apenas ISS.
Outra grande vantagem é redução de obrigações: como o SeAC não é regulado pela Anatel, as empresas não teriam que cumprir obrigações de qualidade, cotas de conteúdo e canais obrigatórios. Por outro lado, ao vender TV por assinatura via internet, operadoras iriam reduzir custos, evitando visita técnica, instalações, equipamentos, cabos e antenas.
Oi e Claro se preparam para lançar o serviço de TV via streaming.
O que muda?
A decisão da Anatel pode ser o início de uma grande transformação de mercado. Para muitos, é nítido que o streaming se tornou uma forte concorrência para a TV por assinatura, apesar de serem propostas diferentes.
Enquanto a TV paga se caracteriza pela linearidade, a internet traz o conteúdo sob demanda à disposição do consumidor, assim como a eventual disponibilização do sinal ao vivo de um canal, como ocorreu com a FOX.
Portanto, o que muda a partir de agora é que as programadoras serão mais livres para ofertar a transmissão de seus canais via internet, por meio de algum serviço de subscrição.
Se isso afeta ou não a TV por assinatura, é cedo para presumir.
Mas, para a TV paga, pode representar o fim do empacotamento, caso o segmento queira concorrer com a flexibilidade do modelo de negócio do streaming.
*Com Informação Anatel, Telesíntese, Tecnoblog e Minha Operadora.