Pedro Bial fala sobre os bastidores da série ''Em Nome de Deus'' em live no Instagram do Canal Brasil

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Pedro Bial foi o convidado de Simone Zuccolotto em live realizada no perfil do Canal Brasil no Instagram (@canalbrasil) dessa quarta-feira, dia 24. O jornalista é o condutor da série documental “Em Nome de Deus”, uma parceria entre o Globoplay e o Canal Brasil, que investiga a história e os crimes de João Teixeira de Faria, popularmente conhecido como o médium João de Deus, condenado a 40 anos de prisão por abusar sexualmente de centenas de mulheres que foram ao seu encontro em busca de cura espiritual. A conversa pode ser assistida na íntegra no IGTV do Canal Brasil.

Durante a entrevista, o apresentador da TV Globo falou sobre o início da produção da série. “O silêncio que se fez durante décadas, era uma pedra em cima da verdade, uma proteção que já se acreditava inexpugnável. O João Teixeira de Faria se achava um cidadão acima de qualquer suspeita, com ótimas relações”, conta.

O jornalista lembrou os primeiros contatos para conseguir uma entrevista com o famoso médium e sua desconfiança em um pedido de João Teixeira de Faria para recebê-lo. “Sou movido a desconfiança. O que me pegou foi ele dizer que não pede nada de quem vem à casa, como ele chamava Abadiânia, só pedimos fé. Esse artigo eu não tenho para oferecer, mas o que realmente me fez decidir não ir, além da falta de fé, é que eu sempre fui repórter, mas teve um momento da minha vida que eu virei apresentador de programa de entretenimento. Se eu fosse a Abadiânia, não poderia ir como repórter, iria como um convidado. E como convidado, seria até grosseiro fazer perguntas incômodas. Então ou eu iria como repórter, o que não era possível naquele momento, ou eu iria nessa função de celebridade, como foi a Oprah Winfrey e várias figuras da sociedade brasileira. E todas elas foram usadas como aval, como um endosso do que se fazia ali”, afirma.

Bial comentou como a entrevista foi levada a novos rumos após a negativa da viagem a Abadiânia. “Meio que desencanei. Mas aí a Camila [Appel, roteirista da série] comentou com uma amiga que eu tinha cancelado a ida. Essa amiga contou que já tinha estado lá e havia rumores”, revela. “Ela começou a achar um padrão nos testemunhos de mulheres de cidades diferentes, de idades diferentes, que nunca tinham se visto e contaram o mesmo padrão de abuso. Aí a gente percebeu que tinha alguma coisa ali. Mas como contar uma história que ninguém tem coragem de se expor, denunciar e falar?”, questiona. Eu atuei muito mais como um editor e curador. A Camila trazia aquele material bruto e a gente ia ajudando a editar e encontrar caminhos. Tinha que ser alguém de fora do Brasil, porque as mulheres do Brasil se sentiam fisicamente ameaçadas pela proximidade. Aí surgiu a história da Zahira [Lieneke Mous, a primeira testemunha]. que fez um post de desabafo no Facebook. Aquilo foi um ponto de partida. Agora nós estamos comprometidos com essa história, temos que levar isso adiante.

O apresentador também contou como a história sobre João de Deus deixou de ser apenas uma reportagem e começou a ganhar ares de uma série documental. “A minha primeira reação foi deixar o jornalismo correr atrás dessa história. Mas a história continuava próxima a nós. Para colocarmos o programa no ar, ouvimos 10 ou 11 mulheres. Em nove dias, foram centenas de mulheres e ele estava preso. Aí o André Saddy [diretor geral do Canal Brasil] me chamou para almoçar e foi dele a ideia de fazer uma série. Por isso é tão importante ressaltar a parceria do Canal Brasil. Foi ele que me cutucou e me provocou a ir atrás disso”, adianta. “Uma das coisas que tornam a série atraente é porque, muitas vezes, quando você vai contar uma história, são histórias que tinham terminado há muito tempo. A nossa não. A gente foi correndo atrás enquanto as coisas aconteciam. E até agora a história não está concluída. O fato do João Teixeira de Faria ter ido para prisão domiciliar por causa da Covid mexeu muito com as mulheres envolvidas na história. Hoje, aliás, é aniversário deles. Isso eu entendo racionalmente, mas imagina uma vítima? Acha que a justiça não está sendo feita. Então essa história não acabou e talvez não acabe tão cedo. Isso dá muita vida à série”, comenta.

Em um trabalho que acredita ser a maior investigação jornalística de sua carreira, Bial falou sobre ameaças sofridas pelos documentaristas – “a equipe narrou que andando em Abadiânia insinuavam e ameaçavam” – e tentou descrever o sentimento de lidar com uma história tão chocante e cruel. “Acho tudo nauseante. No fim do primeiro episódio, você descobre que uma das mulheres é filha do João. Quando você percebe que a filha de 10 anos foi obrigada a conviver conjugalmente com o pai durante toda a adolescência. Não consigo dizer isso sem sentir engulhos”, diz.

"Passada essa vontade de vomitar, talvez seja importante a gente tentar entender por que uma história como essa só dificilmente aconteceria em outro lugar que não o Brasil. Estão ali presentes muitos sintomas brasileiros. Está ali presente a herança do coronelismo. O João Teixeira de Faria era um coronel de Abadiânia. A procura por soluções milagrosas, mágicas. Eu acho isso perfeitamente compreensível que uma pessoa condenada, desenganada, ela tente tudo pela vontade de não morrer. Mas não são só esses casos. As pessoas iam lá para parar de fumar. Você ir quieto, no seu desespero, com tentativa terminar, buscar uma solução milagrosa, é compreensível. Você elevar um curandeiro, um charlatão, à altura de um salvador da pátria, é um absurdo”, comenta.

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